segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Crônica de Adeus

Finda-se o homem, sobrevivem as palavras. Não sei se isso é ou não alento. A vida tem lá seu prazo de validade, todavia, sabemos, alguns partem antes. Pelo menos essa é a sensação que fica. Pessoas-ponte, pessoas-palavra boa, deveriam ser (de verdade!) imortais, deveriam sempre estender seu olhar de abertura àqueles que desejam uma palavra de ânimo, um gesto de encontro.
Sempre acreditei que quem escreve deve ser mão estendida ao leitor. As histórias vertidas em papel não podem jamais ser prazer individual. Palavras escritas, viradas livro, têm que ter a capacidade de soar no ouvido do outro, de mexer nas entranhas do outro, de qualificar o outro. Palavra que gera riso e choro, gera agonia e alento, sofrimento e esperança, trabalho e prazer.
Poucos são, no entanto, aqueles escritores que, ao atingir um patamar de grande autor, com vasta obra, inúmeras traduções, diferentes premiações, seguem crendo que, antes de serem artistas, são gente. E gente anima, estende mão, gasta um tanto de seu tempo, sorri, troca ideias com quem quer que se aproxime e seja desejo de partilha. Às vezes no afã de aprender, outras vezes apenas para estar perto, para ouvir o que aquele tem a dizer.
Scliar era, antes de um grande autor, esse tipo de gente-gente.
Nos contatos que tive com ele, uma ou outra viagem, ele sempre era gente. A imortalidade não lhe trouxe estrelismo algum, não lhe fez ser pessoa esnobe, chata, pedante. Ao contrário. Acho que apenas mostrou-lhe que as conquistas vinham do tanto de humano que ele era, ou talvez nem isso. Talvez para ele (médico público) ser gente fosse condição obrigatória para quem desejasse lidar com gente, ou talvez a origem humilde, ou sabe-se lá quantos talvez.
O fato é um: a Literatura perde com a saída de cena de Moacyr Scliar, mas mais que a Literatura a vida perde um homem. Homem no sentido mais amplo que a noção de humanidade possa nos proporcionar.
Agora, ficam suas palavras, suas histórias. História que não optaram por um público específico. Escreveu para todos: crianças, adolescentes, adultos. Sabedor que aquele que conta histórias conta-as para o mundo, para todo mundo, e elas vão sempre encontrar lugar no coração de gente que ame as palavras. Como eu. Como talvez você que me lê.

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Catálogo de Bolonha/2011

Meu livro As luas de Vindor, editado pela Biruta, foi selecionado pela FNLIJ para fazer parte do Catálogo de Bolonha, cuja publicação circulará pela Feira de Bolonha (Itália), espaço importante de divulgação do que melhor se faz em publicações destinada ao público infantojuvenil no mundo.
Minha alegria maior (e surpresa) é que — com a história de Olívia, uma jovem princesa adolescente que se vê, sem esperar, envolvida numa trama que remonta à sua própria origem — pela primeira vez enveredei pela seara da literatura fantástica, construindo um mundo paralelo ao nosso e regido pelas três grandes luas: Vindor. É lá que Olívia encontra Cefas e Vislo, e enfrentará Bizarra e seu exército de Descarnados.
Livro de demorada escrita. Livro em que não queria mergulhar apenas na aventura, mas também discutir questões existenciais. Livro diferente em minha tragétória de escrita. Livro que me proporciona essa alegria.

O início:
"No dia em que a vida de Olívia mudará sem que ela saiba, as três luas que iluminam manhãs e tardes em Vindor formam um triângulo, tingindo de tons de vermelho o céu. Um vento quente balança as árvores do jardim do palácio imperial e joga as folhas avermelhadas sobre o gramado: vasto tapete, que se estende até o labirinto de plátanos. É tarde de quase outono. Dia de calor. Dia de acontecimentos inesperados". (pag. 7)

A capa:

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Ainda Pedro Noite...

Em abril, lançarei, em sessão de autógrafos, meu mais recente livro: Pedro Noite. O texto é antigo, a edição novíssima. Pela primeira vez, enveredo pelo terreno da prosa-poética, contando a história de um menino negro como a noite. História nascida a partir de meu encontro com um grande cara, momento em que pude saber um pouco mais da infância do Pedro, agora meu personagem, sensivelmente traçado por Mateus Rios.



Pedro era garoto,
destes que de tudo ria,
menino pintado de noite,
olhos de estrela,
boca de lua crescente,
canção de pássaro entre os dentes.

Garoto Pedro era,
que desde o muito pequenino.
o lábio ia apertando
pra ficar no sempre bem fino.
Assim, mandava o pai,
assim fazia o menino.
E, nestas coisa de fazeção,
a vida é que vai mesmo no fazido.
(Pedro Noite. Editora Biruta: São Paulo, 2011)

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Oficina Literária

Há alguns anos, tenho ministrado Oficina Literária no Sintrajufe-RS. As inscrições são por semestre e, na Feira do Livro de PoA, há sessão de autógrafos de antologia que reúne os participantes das oficinas e os vencedores do Concurso Literário Mario Quintana, promovido pela Secretaria de Cultura do Sintrajufe e coordenado por mim.
Abaixo, datas e horários. Informações com Ana Paula ou Fabrine, através do fone: (51) 32351977

Módulo I - Conto
Dia da semana: segundas-feiras
Horário: 19h às 21h30min
Duração: 21 de março a 16 de maio

Módulo II - Miniconto
Dia da semana: segundas-feiras
Horário: 19h às 21h30min
Duração: 23 de maio a 18 de julho

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Sobre "Pedro Noite"

O bom de escrever (e publicar) um texto são as manifestações que eles por vezes suscitam. Minha primeira incursão pela narrativa-poética, com o Pedro Noite (Ed. Biruta), vez com que a escritora Alessandra Roscoe deixasse esse post no face para mim. Quero que seja partilha com quem mais andar por aqui.

"Caio, adorei o Pedro Noite! Será a próxima dica de leitura do blog e também do site da Biblioteca Nacional de Brasília. Achei de uma poesia arrebatadora, gostei de tudo, dos versos, da temática, das ilustrações, da textura do papel, dos cheiros, sabores e ritmos de uma África que vive em nós tão pulsante e inspiradora. Parabéns! E saiba que a aprovação foi geral aqui em casa! Meu trio de leitores críticos não anda fácil, aliás, quarteto, pois além das crianças, Orlando, o maridão, entrou na onda há um bom tempo!"

Ah, e em seu blog: http://contoscantoseencantos.blogspot.com, Alessandra deixou comentário como Dica de Leitura.
Valeu, Alessandra, meu carinho!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Fragmento Literário 3

De O velho e o mar - Ernest Hemingway - Bertrand Brasil


"A camisa havia sido remendada tantas vezes que mais se assemelhava a uma vela, e os remendos, sob a ação do sol, tinham-se esbatido em diversos tons. A cabeça do velho era muito velha e, com os olhos fechados, não havia vida no seu rosto. Tinha o jornal estendido nos joelhos e o peso do braço impedia que a brisa da tarde o levasse. Estava descalço." (pag.23)

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Gente Nova 15: Cristina Desouza

Cristina Desouza é carioca. Mas deixo que ela mesma se apresente: um dia me vi perdida nas noites de Phoenix. Ainda tento me achar até hoje, enquanto me deixo levar pela vida das ruas nesta cidade. Há um deserto a me consolar. Marrom tem vários matizes e estou aprendendo a pintar. Escrevo desde sempre, mas sou médica de profissão. Encontro-me em palavras, só para tornar a me perder nelas...
a fuga passa por mim
a minha espera
cansada me rendo
ouço a música
o vento
e de súbito
só resta
a terra