domingo, 25 de janeiro de 2015

Sobre livros, sebos e autógrafos

Eu prefiro a Serra ao Mar. Talvez seja estranho, mas sei que não estou só, tantas eram as pessoas passeando por Gramado e Canela neste final de semana. E na volta, a visita à Livraria Miragem, em São Francisco de Paula, trouxe algumas boas surpresas. A primeira, claro, é perceber a pujança de uma livraria como esta. Espaço nunca antes visto por estas terras. Vale a visita, com certeza. Diferentes ambientes, livros e livros, além de um outro tantos de coisa bonita pra se ver. E a segunda foi descobrir no sebo (há um sebo no andar superior da livraria!) um livro do poeta Paulo Hecker Filho. O primeiro editado pela Edições Fronteira. Isto em 1950. E o livro veio com o autógrafo, dado no mesmo ano, para uma certa Norma. Aliás, havia vários livros autografados para esta mulher. E eu e Laine já imaginando alguma história para ela. Ou várias.
Na verdade, fiquei pensando sobre quem teria se desfeito dos livros da Norma, para quem eles (e ela também, visto que sua marca, seu nome, estavam presentes naquelas páginas) não tinham a menor importância? Estranho este sentimento de pertença com os livros. Sobretudo os autografados. E Norma, possivelmente, não vive mais; assim como o poeta. E o livro, umas raridade: a primeira edição de uma editora que não sobreviveu sabe-se lá por quais motivos. Provavelmente, as questões financeiras já adiantadas na orelha (abaixo transcrita). Alguém se desfaz de um livro, de um livro autografado, de um livro que uniu no passado e, talvez, para sempre, Norma e Paulo. Um livro destes deveria ser herança da qual jamais os herdeiros se desfazem: os poemas sempre a dar conta de quem os escreveu, de quem os leu, de quem passou por estas páginas agora amareladas seus dedos, como carinho, e suspirou e se inquietou e se desacomodou ou se enterneceu com a lírica nele presente.

Um livro é para sempre. E este, que foi de Norma, hoje é meu. E eu me sinto próximo desta mulher que não conheci, e deste poeta que nunca eu tinha lido antes, mas do qual sempre havia ouvido palavras que atiçavam o desejo do desvendamento. O poema que abre o livro:

RIMBAUD

Pelas calçadas em luz baça
os ratos tomam vinho
no cuspe alcoólico dos bêbados

Leio Rimbaud.
                         10-4-49


Ah, e vejam só o que diz na orelha do livro "Ah! Terra", de Paulo Hecker Filho. Lembrando: a edição é de 1950.
"É êste o primeiro livro lançado por FRONTEIRA, revista da nova geração literária do Rio Grande - primeiro marco de um programa editorial que vai permitir o aparecimento de várias obras de escritores e poetas nossos, no momento a se estiolarem pelo silêncio a que os obriga a falta quase absoluta de publicações literárias entre nós e o comercialismo prudente dos editôres. Iremos realizando, na medida da possibilidade econômica, a publicação dos originais escolhidos (...)¨ 

E aí segue citando os próximos autores. Entre eles, Mario Quintana, Guilhermino César e Augusto Meyer. Ou seja: autores, desde sempre, penam para terem seus textos publicados. A luta inglória vem de longe, bem longe.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Reflexões breves 2 - Sobre finais

Todo o final pressupõe um recomeçar. Sempre há uma porta a ser aberta, uma estrada pela qual seguir, uma sombra a propiciar descanso, uma luz lá adiante a indicar rumos. Em épocas de encerramento, como esta de fim de um ciclo anual, o desejo de balanço das ações passadas sempre surge, urge, ruge. Bom, quando se pode olhar para o pretérito e prospectar nele futuros. O tempo é, pois, para futurar. Tempo para, em cima dos acertos e dos equívocos dos 365 que findam, orquestrar um novo início. Que o novo ano traga potencializado o tudo de bom do que se vai e que a capacidade de sonhar jamais seja apagada dos corações inocentes. Apesar de todos os pesares que possam acenar no horizonte. Apesar. Sigamos em frente, sempre em frente, sabendo colher da jornada aquilo que foi (ou será) fruto. E madureza.

Reflexões breves 1 - Sobre amizade


Amigos - os leais, os sinceros - são dádivas. Seus elogios não são enganadores; suas palavras não são bajuladoras; sua presença não é só estar perto. Um amigo sabe-se parte, entende-se parceria, quer-se proximidade. Um amigo, creio, é família escolhida: laços bem mais fortes do que os biológicos. Amigo é terra sempre fértil, mesmo em momento de seca ou de pragas.
Bendito o que semeia amizade, pois colherá fruto semelhante ao plantado.