quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Palavras 22


FIM: todo o fim pressupõe um recomeço, um novo desejo de ser, como se, ao nos atirarmos num voo cego em abismo, desconhecêssemos o que lá embaixo nos espera. Engano, tudo é sempre, e apenas, esperança. Ela, sim, se destruída, certeza do fim.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Por um Brasil Literário

Recebo manifesto Por um Brasil Literário, de Bartolomeu Campos de Queirós:

Caio, hoje, me vi pensando como seria viver em um país de leitores literários. Pode ser apenas um sonho, mas estaríamos em um lugar em que a tolerância seria melhor exercida. Praticar a tolerância é abrigar, com respeito, as divergências, atitude só viável quando estamos em liberdade. Desconfio que, com tolerância, conviver com as diferenças torna-se em encantamento. A escrita literária se configura quando o escritor rompe com o cotidiano da linguagem e deixa vir à tona toda sua diferença – e sem preconceitos. São antigas as questões que nos afligem: é o medo da morte, do abandono, da perda, do desencontro, da solidão, desejo de amar e ser amado. E, nas pausas estabelecidas entre essas nossas faltas, carregamos grande vocação para a felicidade. O texto literário não nasce desacompanhado destes incômodos que suportamos vida afora. Mas temos o desejo de tratá-los com a elegância que a dignidade da consciência nos confere.A leitura literária, a mim me parece, promove em nós um desejo delicado de ver democratizada a razão. Passamos a escutar e compreender que o singular de cada um – homens e mulheres – é que determina sua forma de relação. Todo sujeito guarda bem dentro de si um outro mundo possível. Pela leitura literária esse anseio ganha corpo. É com esse universo secreto que a palavra literária quer travar a sua conversa. O texto literário nos chega sempre vestido de novas vestes para inaugurar este diálogo, e, ainda que sobre truncadas escolhas, também com muitas aberturas para diversas reflexões. E tudo a literatura realiza, de maneira intransferível, e segundo a experiência pessoal de cada leitor. Isto se faz claro quando diante de um texto nos confidenciamos: "ele falou antes de mim", ou "ele adivinhou o que eu queria dizer".Caio, o texto literário não ignora a metáfora. Reconhece sua força e possibilidade de acolher as diferenças. As metáforas tanto velam o que o autor tem a dizer como revelam os leitores diante de si mesmo. Duas faces tem, pois, a palavra literária e são elas que permitem ao leitor uma escolha. No texto literário autor e leitor se somam e uma terceira obra, que jamais será editada, se manifesta. A literatura, por dar a voz ao leitor, concorre para a sua autonomia. Outorga-lhe o direito de escolher o seu próprio destino. Por ser assim, Caio, a leitura literária cria uma relação de delicadeza entre homens e mulheres.Uma sociedade delicada luta pela igualdade dos direitos, repudia as injustiças, despreza os privilégios, rejeita a corrupção, confirma a liberdade como um direito que nascemos com ele. Para tanto, a literatura propõe novos discernimentos, opções mais críticas, alternativas criativas e confia no nosso poder de reinvenção. Pela leitura conferimos que a criatividade é inerente a todos nós. Pela leitura literária nos descobrimos capazes também de sonhar com outras realidades. Daí, compreender, com lucidez, que a metáfora, tão recorrente nos textos literários, é também uma figura política.Quando pensamos, Caio, em um Brasil Literário é por reconhecer o poder da literatura e sua função sensibilizadora e alteradora. Mas é preciso tomar cuidados. Numa sociedade consumista e sedutora, muitos são leitores para consumo externo. Leem para garantir o poder, fazem da leitura um objeto de sedução. É preciso pensar o Brasil Literário com aquele leitor capaz de abrir-se para que a palavra literária se torne encarnada e que passe primeiro pelo consumo interno para, só depois, tornar-se ação.
Caio, o Brasil Literário pode, em princípio, parecer uma utopia, mas por que não buscar realizá-la?
Com meu abraço, sempre, Bartolomeu

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Que venha 2010!

Mais um ano finda, ano bom, cheio de atividades e de bons projetos. 2010 acena com outras tantas possibilidades, e a vida vai se fazendo mesmo de ciclos, a necessidade de cada vez mais lançarmos metas, buscarmos sonhos, arquitetarmos palavras.
Muito andei pelo RS (algumas vezes também fora dele). E não quero que este post seja um elenco do feito. Mas dia 10 de dezembro encerrei atividades em escolas, visitando o Colégio Mario Quintana, em Pelotas. (foto de Paulo Rossi)

No link que segue há matéria jornalística sobre minha visita.

http://www.diariopopular.com.br/site/content/noticias/detalhe.php?id=3&noticia=10412

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Quinze anos

14 de dezembro de 1994: lançamento de meu primeiro livro. O infantil Um palito diferente, publicação da editora Interpretavida, na Casa de Cultura Mario Quintana. Emoção muita. Minha história ali, virada livro, meus personagens prontos para ganhar os leitores e eu desejoso de mais livros pudessem vir após aquele.

Ontem, 14 de dezembro de 2009: no Teatro Renascença, na Noite do Livro, comemoro os 15 anos com o Açorianos de melhor livro infantil para minha coleção Historinhas bem... Autoria dupla, surgida do convite da Márcia Leite. Parceria vencedora.

E não posso deixar de olhar para trás, de perceber que a espera e o trabalho, de certa forma, deram frutos. Hoje, algumas editoras, muitos livros. Para os mais diferentes públicos. Mas a primeira vez que um texto meu, feito para crianças, recebe destaque da crítica. Fico feliz. Bem feliz. A coleção Historinhas bem — composta por quatro diferentes títulos: apaixonadas, assustadoras, asquerosas, medrosas — também tem feito trajetória bacana rumo ao coração dos leitores. Legal também ontem poder compartilhar alegria com pessoas que me têm afeto. Essa talvez a maior premiação: poder agregar parcerias pela vida a fora.

Os premiados

(Foto: Ricardo Chaves/Zero Hora)

Abaixo link com matéria da Zero Hora sobre a Noite do Livro: http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2749561.xml&template=3898.dwt&edition=13731&section=999

domingo, 13 de dezembro de 2009

Caio Leitor 13: O hobbit e mais alguns

Leituras sempre têm seu tanto de subjetividade. Difícil mesmo é passar sem ler. Ando com vários livros começados à espera de um tempo maior para que a completude se faça. Alguns esperam mais, outros menos. No momento, concluí O hobbit, do J.R.R.Tolkien. Livro fundante do que se convencionou chamar de alta fantasia. O autor cria um universo repleto de seres fantásticos, um mundo à parte, um universo que se sustenta a partir da palavra fundadora. Confesso que não foi leitura das mais prazerosas, leitura realizada com o intuito do debate no 32º encontro da Reinações (Vida longa a ela!), leitura meio lenta em virtude das constantes descrições, talvez com o objetivo maior do autor de construir com maior concretude seu mundo mítico. Mas há momento bons. Bons não, muito bons no que diz respeito ao fascínio que um texto literário pode provocar em seu leitor. Li com prazer o encontro do protagonista com o "espelhado" Gollum. Ecos de Édipo em seu conflito com a Esfinge (Decifra-me ou te devoro): o jogo de adivinhas e suas possíveis respostas como condição essencial para a permanência da vida. Vivemos assim mesmo: prontos a dar respostas, sendo desafiados o tempo todo a desvendar enigmas. No fim, livro que vale a pena ser lido.
E me envolvo com outras leituras também: Reparação, de Ian McEwan, Precisamos falar sobre o Kevin, de Lionel Shriver, O fio das missangas, de Mia Couto e, ainda, A paixão pelos livros (texto de ensaios e contos em que a relação com os livros é revelada por diferentes autores, desde filósofos até escritores, quer narradores, quer poetas).

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Caio cronista 6: Ler: para que mesmo?

LER: PARA QUE MESMO?
Caio Riter

Uma criança sem livros é o prenúncio de um tempo sem idéias
Maria Dinorah

A pergunta-título parece desnecessária. É claro que conhecemos sua resposta: ler para socializar, para desenvolver a sensibilidade, a criatividade, a imaginação criadora, a compreensão do mundo, a competência lingüística. Afinal, diz o senso comum, a leitura ensina a escrever. Inexiste um bom conhecedor da língua que não seja leitor. Assim, leitura e escrita se interpenetram. Professor que quer ensinar a escrever, deve antes ensinar a ler.
Até aí, tudo bem. O problema é que a atividade da leitura na escola, na maioria das vezes, tem-se baseado em alguns pré-conceitos. O maior deles é que ler é prazer. Só prazer. Destituído de qualquer atividade intelectual. Pensar assim, parece-me perigoso, pois reforça uma postura de lazer em relação à leitura, sendo que lazer, convenhamos, varia conforme o “gosto do freguês”. Outro senão é que, geralmente, no ensino fundamental, a leitura é uma atividade, com exceção de algumas iluminadas famílias, essencialmente escolar. Ler livros passa a ser atividade da “hora do conto”, momento em que um professor “especializado” faz uma rodinha, lê algum texto e propõe algumas atividades lúdicas que, muitas vezes, não tem nada a ver com o que está sendo realizado em sala de aula. Por exemplo: desenhar a parte do livro que chamou a atenção ou, ainda, inventar um outro final para a história.
Tal postura, apesar de muitas vezes bem intencionada, pode levar a criança a concluir que existe um espaço reservado para o livro: o educacional. É na escola, com a profe da hora do conto, que se lê “livrinhos”; em casa o lazer ou o prazer pode se dar de outras formas. As mais comuns: televisão, jogos eletrônicos, computador, skate. Ora, tal concepção, longe de formar leitores, cria esferas próprias para a leitura. E, creio, não adianta o professor dizer para seus alunos como é bom deitar-se com um livro ao lado e mergulhar num mundo desconhecido, abrindo mente e coração para a fantasia do universo que se descortina. Neste caso, parece-me, a fala não basta. Carecemos de atos e de exemplos.
O que quero dizer, enfim, é que lugar de livro não é só na escola. Não deve ser. Defendo a indicação de leituras extraclasse, defendo o resgate de textos clássicos da literatura universal, defendo a realização de um trabalho fruitivo-intelectual com os textos indicados, assegurando a consciência de que o livro traz prazer, mas traz também conhecimento; e que a minha casa é também lugar de livro. Leio em casa, na escola, no lotação, na praia, em qualquer lugar. Leio porque sei que a leitura é caminho para meu crescimento cognitivo e social. Leio porque tenho livros à minha disposição, aos montes. Quer na escola, nas bibliotecas, em casa: local em que, ano após ano, vou, assessorado e motivado por meus professores, criando minha biblioteca particular. Afinal, a leitura de um bom livro não é atividade única ou isolada. É retorno, é releitura e motivo para novas descobertas. Enfim, como diz Marly Amarilha, “que a busca por livros não seja um hábito apenas, pois já nos ensina a cultura popular que o hábito não faz o monge, mas que seja o encontro de um leitor com o seu tempo interior, no interior de uma biblioteca”.
E que bom se essa biblioteca for sua, resultado de seu crescimento como leitor. Para tal, a partir do momento em que a criança é capaz de decodificar o código lingüístico, a indicação e cobrança de leituras extraclasse é fundamental e deve ser encarada como uma das prioridades para a formação de um leitor crítico e permanente.