quinta-feira, 30 de abril de 2020

Outras Palavras 30: Charles Beaudelaire

"Quem olha de fora, através de uma janela aberta, não vê jamais tantas coisas quanto quem olha uma janela fechada. Não há objeto mais profundo, mais misterioso, mais fecundo, mais tenebroso, mais deslumbrante que uma janela iluminada apor uma vela. O que se pode ver  à luz do sol é sempre menos interessante do que o que se passa atrás de uma vidraça."

domingo, 26 de abril de 2020

Em tempos de isolamento, eu sendo parte de/da Projeto

          Estes tempos que exigem isolamento social não têm sido capazes de nos deixar sozinhos. As redes sociais assumiram um papel bastante importante no contato necessário para que a gente não sucumba. Afetos são necessários. E, se não temos a possibilidade do toque, do beijo, do abraço; a possibilidade de sentir o calor do outro, de ouvir a voz do outro límpida de qualquer intermediação, temos meios para trocar ideias com o outro e, por meio das ideias, o carinho. 
          Nunca, creio, houve tantos encontros virtuais, quer para trocas sociais, quer para que a vida siga, se não seu curso natural, pelo menos seu cumprimento de demandas: aulas, reuniões, shows. Lives e mais lives estão inundando nossos dias. Uma overdose de lives, de gente buscando ir ao encontro do outro. Isso é bom, bem bom.
        Pois foi assim que acabei retomando o marcador Palavras, abandonado há muito aqui em meu blog. Vi material elaborado pela Escola Projeto (Porto Alegre-RS), da qual sou o autor homenageado neste ano de 2020. E a homenagem é daquelas boas: durante o ano, comunidade escolar toda está envolvida com meus livros, meus poemas, meus personagens. E, como o vírus afastou alunos das aulas presenciais, mas não impediu que projetos de leitura sigam, encontrei um vídeo da Projeto incentivando os seus alunos (meus leitores) a se inspirarem no marcador Palavras e criarem definições poéticas para palavras que façam parte de seu ambiente de confinamento: suas casas, seus lares. 
       Que palavras afinal estão presentes nas coisas com as quais convivemos em nossa moradia e, na maioria das vezes, nem vemos, nem percebemos? Pergunta boa de nos fazermos: o olhar buscando novidades naquilo que nos parece tão conhecido. E também a novidade de dizer uma palavra por meio de outras: uma definição bastante pessoal, um tanto poética, para aquilo que se parece tão comum, tão prosaico.

         E se alguém quiser ter acesso ao trabalho bacana de leitura que a Projeto tem desenvolvido, segue link para vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=FeruQriMgTk&list=PLHxUYzVUJxIMDDa3IlF5iN8COigm-CpEu

Palavras 42: Quarentena

                                                                                                                                                                   
QUARENTENA: Lá fora, o vírus é condição de isolamento. Aqui, no dentro, sou asas ao encontro de mim e do outro. Nem sempre fronteiras seguram pássaros.

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Primeiros passos leitores

          Nestes tempos de isolamento, que eu acreditava que seria extremamente produtivo para leituras e escritas (grande engano), me ocupo, entre outras atividades, a fazer pequenos mergulhos em minha história leitora.
          Eu não tinha livros em minha casa, pelo menos não muitos. Minha mãe costumava contar histórias de medo, quando a noite caía; meu pai costumava ler uns livretos pequenos, que continham aventuras de uma espiã chamada Brigitte Monfort. Eu ficava vendo meu pai mergulhado naquelas páginas e, sei lá o porquê (teria vislumbrado algum brilho diferente em seu olhar tão pouco acolhedor?), um dia resolvi pegar aqueles livros. Lá encontrei aquela mulher de corpo torneado, olhos violeta e cabelos negros, um clichê de mulher, que, aos olhos juvenis, foi enorme atração. Ela era forte, inteligente, uma verdadeira fera quando o assunto era atacar seus inimigos. E eles eram muitos, de todos os gêneros, de todas as nacionalidades. Brigitte passava por perrengues pesados, mas no final, com ou sem a ajuda de seu namorado, o agente Nº 1, saía vitoriosa. Por vezes, um pouco machucada, mas sempre bela e altiva.

        Minha infância literária, meus primeiros passos pelo universo da palavra, não foram com livros. Além das aventuras da "filha de Giselle" (a mãe de Brigitte foi uma espiã assassinada pelos nazistas), eu li também gibis. Trocava-os com meus colegas de infância, sobretudo com o Claudiomar, o que nos garantia acesso a um número maior de gibis do que aqueles que nossa condição econômica poderia adquirir. Gibis usados também eram mais baratos nas bancas de revistas. Vinham meio estropiados, mas as histórias estavam ali: sempre sendo convite. Gostava, lembro, das aventuras do Pena Kid, não curtia o Pato Donald, nem tampouco aquele ranço capitalista do Tio Patinhas. Talvez lá já nascia o Caio pouco afeito a ostentações.
          Todavia, se circulava pelos gibis, não os preferia à Brigitte. Bastava um novo livro dela entrar em casa pelas mãos de meu pai, para que eu deixasse outros afazeres de lado para aguardar expectante que ele concluísse a leitura. Aí, eu sabia, Brigitte seria só minha. Eu e ela mergulharíamos juntos naquele universo tão fascinante e que, hoje, eu acho tão óbvio.
          Por vezes, a obviedade é necessária para que a atração, a sedução, ocorra. Depois de contaminado pelo prazer pelas palavras, bom aí os caminhos estarão abertos para que o leitor escolha as melhores estradas para trilhar. Comigo foi assim. Cada um tem sua trajetória de leitura. São poucos os que começam pelo topo. Talvez, melhor subir pela base, firmando pés, aí o risco de queda ou de abandono da trajetória poderá ser menor.

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Quarentena e Arte: breves comentários

       
      Os tempos são de isolamento social. É importante ficar por casa sempre que possível, evitando saídas desnecessárias a fim de que o mal seja menor. Isolar-se, neste momento, significa não participar de aglomerações. Nada de cinema, de teatro, de show, de visitas a museus. A arte será consumida em nossa solidão. Teremos que aprender a conviver conosco mesmos e também com aqueles que vivem com a gente e com os quais, por vezes, esquecemos de interagir. 
     E se a Arte não pode ser consumida presencialmente, muitos artistas têm disponibilizado peças, livros, shows, músicas, de forma virtual e gratuita. Porém, artistas precisam sobreviver, precisam receber por seu trabalho ou ficarão desassistidos, como a cigarra, aquela da célebre fábula, que, em um momento de inverno, em que as formigas se isolaram em sua quarentena. Assim, urge que surjam ações governamentais para que artistas possam se manter ativos nestes momentos de isolamento social, mas não de paralisia artística.

II
         É preciso que nos reorganizemos. O próprio mercado editorial tem feito alguns recuos. No meu caso, por exemplo, estou vivendo algumas diferentes posturas das editoras com as quais trabalho (ou com as quais trabalharia). Algumas recuam, outras aguardam, outras ainda ousam: estas percebem que na crise deve-se ser ousado e não paralisar a vida e a arte. 
             Uma das editoras com as quais trabalho, por exemplo, adiou a impressão de um novo livro que estava prestes a sair. Ficará aguardando tempos melhores, porém sua edição segue adiante. Outra editora me solicitou um original: reeditará meu "Um menino qualquer", que já teve duas edições, a primeira pela WSEditor, a segunda pela Planeta, sendo brinde do MacLanche Feliz. Bom, quando um texto se mostra sempre novo, terá possibilidade de agradar a novos leitores. Outro evento, porém, foi o cancelamento de uma publicação. Editora nova com a qual eu iria lançar um texto desistiu da publicação. Entristeço, claro, todavia entendo. Há tempo para novas parcerias, há tempo para recuos. 

III
            E eu escrevo. Que mais posso? Por vezes surge um poema desgarrado. No mais, digito meu novo original juvenil, que tem como título "O sobrevivente" (confesso que sempre quis um livro com um título assim, simples, curto, apenas um artigo e um substantivo). Digo digitar, pois o fiz todo de forma manuscrita, recuperei um tempo de juventude em que meu material de escrita era papel e caneta. Foi bom, a atmosfera e a estrutura me exigiram a escrita mais automática, mais desenhada, fluida.