sábado, 12 de maio de 2012

Crônica: Ser pai é bom demais.

 
Ser pai é bom demais.

Caio Riter

            Houve um tempo em que eu acreditava que pais eram mães ou que, pelo menos, podiam ser. No sonho de ser pai, do qual eu me alimentava, sabia que homens e mulheres se tornam iguais no momento da concepção. Diferenças inexistiam, era o que pensava. Afinal, basta transitar pelas ruas de nossa cidade e encontraremos muitos pais em funções outrora essencialmente maternas: bebês no colo, mamadeiras em apronte, carrinhos que vão sendo guiados com delicadeza por másculas mãos, futuros sendo empurrados pelos balanços e carrosséis da vida, mãos seguras a guiar caminhos. Eu tinha essa certeza; a observação e o sentimento é que a gestavam em mim: pais e mães são indistintos na vida de um filho.
            Assim, na minha fantasia, eu ia sonhando e me preparando para ser um pai-mãe. Homem repleto de maternidade.  na minha fantasia, eu ia sonhando, me preparando para ser um pai-mistezas, com suas certezas e hesitaçuista, a cada despertar,E como inexistem forças capazes de impedir que um sonho bem sonhado real se torne, virei pai. Coração explodindo em grávida expectativa.
            Curti desde o primeiro instante aquela semente que crescia no ventre da mulher amada. Experiência repetida. Duas outras mulheres vindo ao mundo, frutos do nosso desejo. E ver aqueles rostinhos desprotegidos, alegres, brilho de afeto resplandecendo a cada carinho, a cada conquista, a cada despertar, sempre foi o presente maior.  Fui, então, sendo — entre erros, acertos e tentativas — o que queria ser: pai.
            Fui homem de acordar na madrugada ao chamado da palavra-mágica; fui homem de me deitar no chão, desprovido de qualquer ameaço de maturidade, para virar barco, cavalo ou outra coisa qualquer, vítima do desejo infantil daquelas que foram sonhadas por mim. Fui homem também de invenção de teatros, de criação de personagens, que iam povoando aqueles pequenos corações e a casa toda; fui homem de canções de ninar, de histórias de boca, inventadas ali mesmo no momento exato da contação; fui herói de afugentar terríveis insetos, monstros horrorosos, que suscitavam gritos e pedidos de proteção. Fui sendo pai do jeito que sabia e que julgava que um pai devia ser.
            Mas jamais fui mãe.
            Um pai, por mais que deseje, nunca será mãe. Só pai, no tudo de bom que um pai possa ser. Porém, apenas pai. Nada mais que pai.
            Um pai, por mais pai que seja, não é mãe. A mulher que gera um outro ser dentro de si estabelece uma relação de cumplicidade que homem nenhum, por mais competente que seja em sua tarefa de amar incondicionalmente seus filhos, atingirá. Nós, os pais, durante a gestação, na verdade, ficamos de fora. Por mais que sejamos chamados a participar, por mais que queiramos gerar junto o bebê que se forma, estamos de fora. Somos parte exterior, um apêndice numa relação visceral. Um coadjuvante que, por mais importante que seja sua participação na trama, é apenas personagem secundário.  Apenas o amigo do mocinho. Amigo que precisa descobrir seus modos de atuação, que precisa fazer-se necessário na urdidura da narrativa familiar, a fim de ser também fundamental parte na história daquele que vai tornando-se gente.
Mas jamais será mãe.
Não nutriu com sua vida a vida do outro, não partilhou com o outro toda a sua carga emotiva, não dormiu o outro no embalo do ritmo do seu coração. Não. E tudo isso antes mesmo do nascer.
As mães, esses seres com os quais estabelecemos uma relação eterna (quer para o bem, quer para o mal), estarão sempre, me parece, na dianteira de qualquer pai que se arvore em mãe. Elas nutrem os filhos não apenas com seu sangue, mas também com suas alegrias, com suas tristezas, com suas certezas e hesitações. Mães alimentam seus rebentos com a própria vida.
            Ser pai, é claro, tem lá sua força no crescer de um filho. É união eterna também. Mas não é sobre isso que falo. Falo de algo que vem de além do nascimento. Relação mágica, dupla, forte.  Não sei se me entendem. Entretanto, é apenas isso: se ser pai é bom demais; ser mãe deve ser melhor ainda.

Um comentário:

luisventurafotografia disse...

Sem palavras, só a emoção de compartir teus sentimentos.